Hoje já não faço árvores de Natal. Guardo-as na memória. Como guardei o cheiro da caixinha de pó-de-arroz que a minha mãe guardava na gaveta de cima da cómoda. Pertença da minha avó, aquele cheiro continha memórias de família de um tempo que não conheci. Era uma herança. E quando a abria todas as coisas boas da minha infância saltavam cá para fora e preenchiam o espaço agora vazio.
As lembranças têm cheiros e têm imagens. Como aquela à luz da noite que acabara de cair, ainda inverno, e um projecto de paixão que não passou de um toque de beijo partilhado na ombreira da porta, o seu primeiro beijo de amor, que se prolongou no tempo por mais de trinta anos. Tinha o sabor da ternura e do mel e do fruto proibido, porque o destino que fazemos assim o quis.